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Fodmap: nutricionista explica dieta que melhora desconforto intestinal

A dieta não é considerada fácil, exige muita disciplina e, em geral, dura entre 4 a 6 semanas - iStock
A dieta não é considerada fácil, exige muita disciplina e, em geral, dura entre 4 a 6 semanas - iStock

Cármen Guaresemin Publicado em 21/03/2022, às 12h00

Conviver com desconfortos intestinais, como cólicas, diarreia, constipação e gases, pode ser indício de sensibilidade a um grupo de alimentos composto por carboidratos de cadeia curta. Para sanar esses sintomas, surgiu a dieta low Fodmap. Ela tem como objetivo restringir por um período os alimentos que dificultam a digestão. Um dos problemas mais comuns de quem sofre com isso é a síndrome do intestino irritável (SII), desordem gastrointestinal generalizada que afeta 10% a 15% da população mundial, de acordo com um relatório do jornal acadêmico Clinical Epidemiology.

Fodmap é uma sigla em inglês (fermentable, oligosaccharides, disaccharides, monosaccharides and polyols) usada para dietas com restrição dos cinco tipos de carboidratos citados: monossacarídeos, dissacarídeos, fruto-oligossacarídeo, galacto-oligassacarídeo e polióis. Esses componentes são de cadeia curta, fermentativos e não digeridos pelo intestino delgado.

A nutricionista funcional e fitoterapeuta Adriana Stavro explica o que é a dieta de baixo Fofmap, quais alimentos evitar e em quais investir. Confira:

O que aconselharia, na área da alimentação, às pessoas com a síndrome do intestino irritável?
Segundo a Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sbed), a SII é um distúrbio gastrointestinal comum, com sintomas como cólicas, diarreia, gases e inchaço. Viver com essa síndrome pode ter um efeito significativo na qualidade de vida de uma pessoa. A dieta é uma forma de controlar os sintomas. Uma abordagem de tratamento comum é evitar os alimentos que desencadeiam os sintomas. Uma dieta para SII, desenvolvida na Austrália, que está tendo muitos benefícios, é a chamada dieta de baixo ou zero Fodmap.

Pode explicar a dieta, por que é indicada e quais alimentos fazem parte dela?
Fodmap são carboidratos fermentáveis que se encontram em uma grande quantidade de alimentos, e que são dificilmente absorvidos pelo intestino delgado, produzindo gases e sintomas, como: distensão abdominal, oscilação entre prisão de ventre e diarreia, fadiga, queda de energia e rendimento ao longo do dia, falta de disposição, queda na imunidade, dermatite atópica e queda acentuada de cabelo. Na prática, por um determinado período (em torno de 60 dias), alguns carboidratos deverão ser retirados completamente da alimentação, outros consumidos em pequenas quantidades, enquanto outros estão liberados para o consumo. Após o tempo de restrição, é iniciado o processo de reintrodução de alimentos no plano, pouco a pouco, fazendo a observação e avaliação dos sintomas conforme indicação do médico ou nutricionista.

Como essas pessoas podem repor nutrientes que encontrariam em alimentos que não devem consumir?
Um bom ponto de partida é fazer uma dieta detalhada e um histórico de sintomas para avaliar as intolerâncias e respostas alimentares individuais. Um exemplo é criar um diário alimentar e de sintomas, que inclui colunas de tempo, alimento/suplemento, quantidade, atividades e sintomas durante o dia, parâmetros que os pacientes podem usar para rastrear informações detalhadas sobre os alimentos e atividades que lhes causam problemas.

Individualização é a chave. A regra mais importante sobre a terapia nutricional é: o que é veneno para um, pode não ser para outro. Por exemplo, algumas pessoas usam ameixas como parte de uma dieta saudável. Elas são famosas pelo efeito laxante, provavelmente porque contêm grandes quantidades de álcoois de açúcar que ocorrem naturalmente. Certos indivíduos com SII podem achar que os álcoois de açúcar estão longe de ser úteis, causando sintomas dolorosos. Porém, nem todos têm esse sintoma. Por isso, manter um diário alimentar é importante – acompanhe o quê e quanto você come, suas emoções e seus sintomas depois de comer.

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Crie um diário e marque tudo o que comer e fizer mal  - iStock

Se notar padrões de sintomas depois de comer certos alimentos, tente removê-los de sua dieta. O diário também pode ser uma boa maneira de registrar o que está acontecendo em sua vida. O estresse desempenha papel importante na SII. Se você está ciente de que o estresse específico traz os sintomas, pode tentar reduzi-lo. Muitas vezes não é o alimento que causa sintomas, não sendo necessário exclui-lo da alimentação. Feito tudo isso e avaliado caso a caso, se houver necessidade, será feito uma suplementação individualizada.

Na sua opinião, o número de pessoas com alergias/intolerâncias alimentares está aumentando ou é uma questão que está sendo mais discutida?
Sim, o mundo está com mais intolerâncias e alergias. A frequência da alergia alimentar aumentou nos últimos 30 anos, principalmente nas sociedades industrializadas. As estimativas dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças sugerem que mais de 40% das crianças americanas têm alguma alergia alimentar, e o número de procedimentos médicos como resultado de alergia aumentou quase cinco vezes entre 2007 e 2016. Não há uma explicação única para isso, mas a ciência tem algumas teorias.

Uma delas é a melhora da higiene, pois as crianças não estão tendo tantas infecções. As infecções parasitárias, em particular, são normalmente vencidas pelos mesmos mecanismos envolvidos no combate às alergias. Com menos parasitas para combater, o sistema imunológico se volta contra coisas que deveriam ser inofensivas.

Outra ideia é que a vitamina D pode ajudar nosso sistema imunológico a desenvolver uma resposta saudável, tornando-nos menos suscetíveis a alergias. A maioria das populações ao redor do mundo não obtém vitamina D suficiente. A vida urbana e o tempo gasto em ambientes fechados, reduzem a exposição a ambientes abertos e à luz solar.

Há também a introdução atrasada de alérgenos alimentares: uma teoria é que os pais estão evitando apresentar aos filhos alimentos potencialmente alergênicos, o que significa que as crianças reagem de forma anormal aos alérgenos assim que os encontram. Essa foi a base de um estudo liderado por Gideon Lack, do King’s College London, denominado Learning Early About Peanut Allergy (Aprendendo cedo sobre a alergia ao amendoim, em tradução livre). O estudo mostrou que, entre as crianças que evitavam comer amendoim, 17% desenvolveram alergia por volta dos 5 anos, enquanto apenas 3% que comiam amendoim na introdução alimentar (aos 6 meses), desenvolveram a alergia aos cinco anos. A teoria é que comer alimentos alergênicos durante o período de desmame, efetivamente prepara o sistema imunológico e o intestino para tolerar bactérias e substâncias alergênicas.

E sobre a intolerância à lactose, muito comum em quem tem a SII?
Indivíduos com intolerância à lactose não precisam evitar laticínios. Nem todos os alimentos lácteos contêm lactose. Os laticínios podem ser naturalmente isentos de lactose, como queijos envelhecidos, sendo bem tolerados por pessoas com formas mais leves de intolerância. Outros itens são isentos de lactose, por meio da adição de enzimas lactase aos alimentos durante o processamento, como os leites e derivados sem lactose. Pessoas com intolerância podem usar enzimas lactase para ajudar a digerir a lactose do leite e seus derivados e consumir leite e produtos lácteos sem lactose. Esses produtos estão disponíveis em supermercados.

É importante ter o acompanhamento de nutrólogo ou nutricionista no caso de se ter SII?
Sim, é fundamental. A estratégia livre de Fodmap não é considerada fácil, exige muita disciplina. Em geral, o tempo da dieta é de 4 a 6 semanas. É muito importante ressaltarmos que a prescrição é feita temporariamente, e a reintrodução dos alimentos é realizada aos poucos, até que os gatilhos sejam identificados.

Abaixo, a nutricionista lista alimentos ricos e pobres em Fodmap:

Frutas ricas em Fodmapmaçã, pera, pêssego, manga, melancia, nectarina, cereja, abacate, sucos naturais, frutas secas, mel, frutose, xarope de milho, ameixa, lichia, uva passa, damasco e (leite de) coco.
Frutas pobres em Fodmapbanana, amora, carambola, uva, abacaxi, melão, kiwi, lima, laranja, tangerina, morango e maracujá.
Laticínios ricos em Fodmapleite de vaca, cabra ou ovelha, sorvete, iogurte (mesmo desnatado), queijo fresco e cremoso (ricota, cottage, cream cheese).
Laticínios e carnes pobres em Fodmapleite sem lactose, iogurte sem lactose, leite de soja, leite de arroz ou amêndoa, manteiga; queijos curados, como cheddar, parmesão, brie ou camembert; peixe, carne, frango ou ovo.
Hortaliças e leguminosas ricas em Fodmapalcachofra, aspargo, beterraba, brócolis, couve, alho, alho-poró, quiabo, cebola, couve-flor, ervilha, grão-de-bico, feijão, lentilha, couve-de-bruxelas, chicória, repolho e quiabo.
Hortaliças e leguminosas pobres em Fodmapbroto de bambu, cenoura, aipo, milho, berinjela, alface, cebolinha, pepino, abóbora, abobrinha, tomate, espinafre, batata, batata-doce e inhame.
Cereais e massas ricos em Fodmappães, bolos, biscoitos ou cereais contendo trigo e centeio, e cereais com xarope de milho.
Cereais e massas pobres em Fodmapfarinhas, pães, macarrão e biscoitos sem glúten, produtos com farinha de milho ou mandioca, quinoa, arroz, tapioca e macarrão de arroz. 

Fonte: Adriana Stavro é nutricionista mestre pelo Centro Universitário São Camilo. Com curso de formação em Medicina do Estilo de Vida pela Universidade de Harvard Medical School e em Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) pelo Hospital Israelita Albert Einstein.

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