Fabiane Gomes Corrêa* Publicado em 07/09/2021, às 10h00
É bastante comum recebermos no consultório de geriatria, idosos que são trazidos por seus familiares angustiados porque não comem de forma adequada. E o primeiro ponto que devemos entender aqui é: o que é comer de modo apropriado para um idoso?
De uma forma geral, eles reduzem sua ingesta alimentar ao longo da vida por muitos motivos: redução do metabolismo pelo próprio envelhecimento, diminuição das atividades que consomem mais energia, mudança de paladar, alterações gástricas, entre outros. Dessa forma, comparar a quantidade que o idoso come com a dos filhos ou netos pode dar a falsa impressão de que ele está comendo menos do que deveria.
Uma dica que auxilia muito nessa avaliação é saber se o idoso está perdendo peso – quem come menos do que precisa apresenta perda de peso e de massa muscular. Assim, pesar seu familiar de forma frequente – uma ou duas vezes no mês, por exemplo – pode ajudar saber se ele está comendo de forma adequada ou não. Peso estável, na maioria das vezes, é sinal de ingesta alimentar suficiente!
Outro ponto importante é que, mais do que quantidade, a qualidade da alimentação é fundamental. O idoso pode até não comer grandes quantidades de alimentos, mas se na sua alimentação existem vegetais e frutas, boas fontes de proteínas, quantidades adequadas de carboidratos, gorduras e líquidos, estão garantidas todas as necessidades de nutrientes que ele precisa.
No processo de envelhecimento, entretanto, aparecem alterações de dentição, paladar e digestão, que fazem com que o idoso tenha preferência por alimentos restritos, como carboidratos (pães, massas, arroz, farináceos) e doces – simplesmente porque sentem mais sabor e comem com mais facilidade esses alimentos. Os carboidratos, entretanto, não garantem isoladamente a preservação de nossa massa muscular. Apesar de representarem o substrato da nossa energia diária e serem fundamentais na nossa alimentação, não garantem isoladamente a preservação da nossa massa muscular, o funcionamento intestinal e um desempenho apropriado do nosso organismo.
Podemos dizer, de forma geral, que as proteínas são os alimentos mais fundamentais para a saúde do idoso. Consideramos fontes de proteínas todos os tipos de carnes (vermelha, aves e peixes), ovos, leite e derivados (queijos e iogurtes), grãos (feijões, lentilhas, ervilhas etc.) e cereais (arroz e trigo integrais, aveia etc.). Esses alimentos são essenciais porque é natural do processo de envelhecimento a perda muscular e quando não garantimos uma ingesta adequada de proteínas associada à atividade física regular. Esse processo acentua-se de forma importante, levando à fraqueza, desequilíbrio, dificuldade para realizar atividades diárias e, consequentemente, maior dependência do auxílio de outras pessoas.
Entretanto, são alimentos mais difíceis de serem mastigados, engolidos e digeridos, fazendo com que uma parte dos idosos tenha uma ingesta inadequada dessas fontes. Se ele não quer comer carne, por exemplo, é sempre importante entendermos se não gosta ou se não é agradável para ele comer esse alimento – às vezes preparos com carne moída, frango desfiado ou peixe ensopado facilitam a aceitação do idoso. Outra opção é substituir carne por queijos ou ovos – que podem, sim, ser consumidos diariamente. Grãos e cereais são outras boas fontes de proteína, então sopas com feijão, ervilha, lentilha, mingaus de farinhas de aveia ou arroz e hommus (pasta de grão de bico) podem ser boas dicas para o aumento de ingesta proteica.
Vegetais e frutas são outro grupo importante para a alimentação do idoso – garantem vitaminas, fibras e são também fontes saudáveis de carboidratos. Eles seguem a mesma regra das proteínas – às vezes são mais difíceis de serem mastigados ou tem um sabor menos atrativo, então é importante adaptar. Cozinhar bem os alimentos mais duros, preparar em pedaços pequenos ou na forma de purês e sempre caprichar nos temperos.
A água é outro grande desafio na alimentaçãodo idoso. Com o envelhecimento nosso “centro cerebral da sede” perde a capacidade de se expressar de forma tão efetiva – ou seja, quando ele diz que não está com sede, é verdade! Entretanto, a água é fundamental para todas as funções do organismo – o idoso desidratado fica mais confuso, sonolento, cansado e letárgico, e pode piorar de doenças crônicas como diabetes, constipação, insuficiência renal, entre outras. Mas não é simples a ingesta adequada de água para o idoso.
O segredo é ter sempre a garrafa de água ao lado, ingerir em poucas quantidades e muitas vezes ao dia ou mesmo “flavorizar” com hortelã, gengibre, gotas de limão, laranja ou pedaços de frutas, além de ofertar vários tipos de líquidos como sucos, chás ou água de coco. O objetivo é consumir 1,5 a 2 litros de líquido por dia, se não houver restrições médicas. E vale ressaltar que refrigerantes, pelo excesso de açúcar e sódio, não são fontes adequadas para hidratação.
O último ponto é entender se o idoso tem estímulo para se alimentar. Em geral, quando nos alimentamos sozinhos, sem horários definidos e sem sentir prazer, a tendência é consumirmos em menor quantidade e alimentos de pior qualidade. Assim, é importante sempre questionar ao idoso se ele não come pela falta de companhia ou porque não tem mais a rotina da família à mesa. Ou, ainda, porque não consegue cozinhar e ingere sempre a mesma comida todos os dias. A partir da resposta, tentar adequar isso da melhor forma possível.
E quando, mesmo com todas as tentativas e adaptações, o idoso não aceita se alimentar e está perdendo peso?
Nesse cenário é importante procurar orientação médica. O idoso que, mesmo com todos os ajustes, recusa alimentar-se pode ter algum problema de saúde. Por exemplo: depressão, demência, alterações gastrointestinais ou de tireoide e mesmo efeitos colaterais de medicações que podem necessitar de tratamento. Em geral, os tratamentos desses problemas melhoram a ingesta alimentar muito mais do que qualquer estimulante de apetite – que, de uma forma geral, não costuma ter indicação ou adicionar algum benefício!
E pode ser também que o idoso, diante de uma perda de peso expressiva ou deficiências vitamínicas, beneficie-se de suplementos – calóricos, proteicos ou vitamínicos. E nesse cenário, tanto o médico quando o nutricionista são os profissionais que podem auxiliar na implantação e supervisão do uso de dessa suplementação.
Por fim, vale ressaltar: a alimentação tem influências multifatoriais, está associada com a saúde física e mental, a socialização e com um organismo ativo e saudável. Sendo assim, não comer de forma adequada é sinal de algum desequilíbrio – seja físico, mental, psicológico ou social. Uma alimentação saudável é consequência de uma vida saudável e vice-versa.
*Fabiane Gomes Corrêa é médica geriatra, com residência em geriatria pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (2015) e pós-graduação em Nutrologia pela Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN). Pós de Gestão Emocional em Organizações pelo Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein. Atua no Hospital Sírio-Libanês e no A.C. Camargo Cancer Center.
Esta coluna não reflete, necessariamente, a opinião do Site Doutor Jairo