Notícias negativas podem deflagrar até crise existencial

Conhecido como "doomscrolling", hábito pode mudar a forma como vemos a humanidade

Tatiana Pronin Publicado em 19/07/2024, às 14h00

Passar muito tempo lendo notícias negativas pode mudar a forma como encaramos a humanidade - iStock

Você já ouviu falar em “doomscrolling”? Essa expressão, em inglês, significa passar tempo demais navegando em notícias negativas na internet, como crimes, ataques terroristas ou conspirações. Um estudo pioneiro sobre o impacto desse fenômeno – comum na vida de muita gente – traz um alerta: o hábito pode mudar a forma como vemos a humanidade e até o sentido da vida!

Pesquisadores da Universidade Flinders, na Austrália, descobriram que o doomscrolling torna as pessoas mais propensas a ficar desconfiadas dos outros, além de gerar uma sensação de que a vida não tem sentido. Os resultados foram publicados no periódico Computers in Human Behavior

Sentido da vida questionado

“O doomscrolling pode ter consequências terríveis para nossa saúde mental e bem-estar, deixando-nos estressados, ansiosos, desesperados e questionando o sentido da vida”, diz o autor principal do trabalho, Reza Shabahang.

Ele explica que essa espécie de vício que as pessoas adquirem de ficar horas navegando por notícias negativas tornou-se uma fonte de trauma, ainda que a pessoa não vivencie, nem tenha vivenciado, pessoalmente as experiências em questão.

“Expostas a imagens e informações sobre eventos traumáticos, as pessoas podem experimentar sintomas semelhantes aos do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), como ansiedade e desespero.”

Culturas distintas, resultados semelhantes

Para chegar à conclusão, os pesquisadores entrevistaram 800 estudantes universitários de duas culturas diversas: uma cultura oriental mais voltada para o coletivo (Irã) e outra, ocidental, mais focada no individual (Estados Unidos). A ideia foi explorar como o consumo excessivo de notícias negativas nas redes sociais pode impactar pensamentos e sentimentos relacionados à existência.

Os participantes foram questionados sobre com que frequência praticavam doomscrolling nas redes sociais, quão ansiosos se sentiam em relação à sua existência, se acreditavam que o mundo é um lugar justo e como se sentiam em relação à humanidade.

Eles queriam ver se havia alguma conexão entre o doomscrolling e pensamentos ou sentimentos subsequentes sobre a humanidade e a importância da vida. O resultado foi bem positivo.

Preocupação excessiva sobre vida e morte

O doomscrolling foi associado à ansiedade existencial, ou seja, preocupações excessivas sobre a existência, vida e morte. Isso foi real tanto para os iranianos quanto para os norte-americanos, e ainda serviu como um preditor de misantropia – aversão às pessoas – na amostra iraniana.

Quando estamos constantemente expostos a notícias e informações negativas online, isso pode ameaçar nossas crenças em relação à nossa própria mortalidade e ao controle que temos sobre nossas vidas. Além disso, o doomscrolling pode afetar negativamente como vemos as pessoas e o mundo ao nosso redor”, afirma.

Shabahang acredita que o estudo é um lembrete para ficarmos atentos aos nossos hábitos online e para a importância de se fazer pausas regulares de redes sociais e controlar a exposição a notícias negativas.

Como minimizar o impacto? 

“Sugerimos que as pessoas prestem atenção ao tempo que passam nas redes sociais e estejam cientes do impacto que isso tem em suas emoções, pensamentos e sentimentos, especialmente quando se trata de notícias e eventos negativos”, afirma.

É uma boa ideia monitorar quanto tempo você gasta praticando doomscrolling e começar a fazer mudanças para reduzir esse tempo. Tomar consciência dos nossos hábitos online, e tomar pequenas medidas para abordá-los, pode ajudar a melhorar nosso bem-estar mental geral. Até porque não dá mais para viver sem a internet. 

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