Esse processo envolve um olhar para dentro de si para lidar com medos, limites e potenciais
Desirèe Cordeiro Publicado em 16/03/2021, às 15h49
Moda? Obrigação? Tendência?
Quem pensa que psicoterapia é igual, ou pode ser substituído por, ir ao shopping, fazer uma viagem, ou, ainda, conversar com um bom amigo, nunca fez psicoterapia de verdade.
Psicoterapia é um processo que se dá em uma jornada do indivíduo, a partir de um pedido de ajuda ao psicoterapeuta, que lhe auxilia nessa jornada. Envolve um olhar para dentro de si para lidar, e por vezes descobrir, seus medos, limites, potenciais. A partir disso trabalhar novas possibilidades de ser para si e para o Mundo.
Por conta da pandemia, a questão da saúde mental das pessoas se agravou e, com isso, está em maior evidência. Temos uma maior restrição de contato social e pouco controle sobre aspectos básicos da nossa vida, como saúde, alimentação, economia etc, e ficamos desordenados dentro do nosso cotidiano, da nossa rotina. E aí alguns sentimentos se mostram mais urgentes que outros, e sim, precisamos cuidar disso.
Nos dias de hoje, muitas pessoas ficam curiosas com o que seria psicoterapia e quando é a hora de fazer terapia, e muitas perguntas surgem. Então, a ideia desse texto de hoje é responder a algumas dessas perguntas!
1. Qual a diferença de terapia, psicoterapia e análise?
A terapia pode incluir uma série de outros profissionais para cuidar e tratar de diferentes males das pessoas. Por exemplo, uma massagem é uma terapia, um tratamento capilar pode ser intitulado como terapia.
A psicoterapia é uma forma de terapia que possui um caráter voltado para o lado emocional do paciente, ela é realizada por um psicólogo e/ou um médico, e tem o intuito de cuidar de questões emocionais e comportamentais, da saúde mental e emocional das pessoas.
Análise é um termos usado por algumas linhas de psicoterapia.
É muito comum abreviarmos psicoterapia para terapia, mas aqui vamos usar o termo completo para não confundir, ok?
Os psicoterapeutas trabalham com a escuta. As pessoas falam sobre si, suas questões, seus problemas. Mas, as sessões não são limitadas simplesmente a esse "ouvir". Esse é um dos motivos que os psicoterapeutas também precisam avaliar o que conseguem "ver" nas pessoas, como se comportam durante a sessão. Isso também é levado em consideração para as propostas durante esse processo de mudança.
2. Quando eu sei que preciso psicoterapia?
É importante saber que a hora de buscar um psicólogo não é somente para quem aparentemente tem uma questão emocional que gera sofrimento. Ou que tenha uma necessidade urgente de acompanhamento por questões que estão inclusive afetando a saúde física, não somente a mental. As pessoas podem se beneficiar da psicoterapia para se autoconhecerem e conseguirem um maior equilíbrio das emoções em diversos campos de sua vida.
Mas sim, as pessoas procuram a psicoterapia principalmente quando algo está lhe incomodando! E você quer mudar isso...
O incômodo pode ser um sentimento ou sensação, seja um comportamento que parece mais intenso ou menos intenso do que normalmente estava. Ou seja, algo que lhe chame atenção, ou de pessoas a sua volta, e que está lhe aborrecendo.
Podemos dar alguns exemplos do que pode estar por fora:
Ou seja, qualquer sensação ou sintoma de algo está diferente do que costumava estar e você não está conseguindo lidar com isso.
3. Por que fazer psicoterapia?
A ideia de fazer psicoterapia tem, geralmente, a ver com sofrimento, mas ela deveria ser encarada com o cuidado da saúde mental de cada um, para buscar o bem-estar emocional. Uma busca para o além do que automaticamente respondemos às perguntas e que pode fazer com que as coisas da vida corram de maneira melhor e mais tranquila, para nós e para aqueles a nossa volta.
4. Psicoterapia é pra pessoas loucas?
NÃO!!! Psicoterapia é para qualquer pessoa.
Pessoas que têm diagnósticos de saúde mental também podem se beneficiar de psicoterapia, mas não apenas elas. Pessoas em diversas situações podem se beneficiar de um processo de psicoterapia, como, por exemplo, dificuldade em realizar uma escolha, mudar de emprego, por uma dificuldade escolar.
5. Como escolho meu psicoterapeuta?
Talvez a principal questão na escolha de um terapeuta é a existência de confiança e uma sensação de que você vai poder falar as coisas para aquela pessoa. Será alguém com quem você muitas vezes falará de coisas que não fala com seus melhores amigos, seus familiares. Então se não houver confiança com certeza o processo não vai andar.
6. Ahhh! Entendi, mas é melhor ser homem ou mulher?
Muitas pessoas têm dúvida se devem escolher um homem ou mulher para terapeuta, e o que isso poderia influenciar. E isso varia, pois tem pessoas que se sentem mais confortáveis na presença de um homem ou uma mulher. Mas, na teoria, qualquer terapeuta tem técnica para fazer com que as pessoas se sintam à vontade para falar de coisas difíceis, independente de gênero.
7. Qual linha teórica devo fazer?
Tem pessoas que nem sabem o que isso significa, mas linha teórica é a teoria escolhida pelo terapeuta para estudar e se aprofundar.
Temos linhas mais diretivas, mais filosóficas, mais psicodinâmicas. Algumas pessoas ficam atentas a essa questão, pois entendem um pouco de teoria psicológica. Mas, a abordagem é secundária a sua escolha, pois tem outras questões que considero mais importantes (falarei delas nos próximos tópicos).
8. Como funciona a entrevista?
Todo terapeuta faz uma entrevista inicial, que é o momento do cliente ou paciente (o termo usado aqui varia de terapeuta pra terapeuta, não existe algo certo ou errado) contar sobre o que tem lhe incomodado, e o terapeuta construir um plano terapêutico com as primeiras impressões. Esse plano envolve contrato de psicoterapia, como valores, frequência, sigilo, modelo (on-line ou presencial), entre outras coisas, e isso também irá variar de terapeuta para terapeuta.
Ah, importante falar aqui que essa primeira entrevista é, em geral, paga, afinal de contas é um horário do terapeuta que está ali de ouvidos atentos e com toda sua expertise (investimento acadêmico, experiência) para que, em conjunto, vocês possam definir se e como vocês irão prosseguir no processo terapêutico.
9. É caro fazer psicoterapia?
Psicoterapia deve ser encarado como investimento, então ser caro ou barato tem a ver com a possibilidade que cada um tem. Existem variados terapeutas, que cobram valores variados.
O valor da psicoterapia está relacionado a diversos aspectos, como o tempo de experiência do terapeuta, aquisição de títulos acadêmicos, localização, disponibilidade, linha teórica, entre outras coisas.
Pagar para “só” falar com o psicoterapeuta pode parecer, para muitas pessoas, algo sem sentido, mas a verdade é que o paciente/cliente não está atrás de opiniões, e sim de alguém que efetivamente tenha estudado comportamentos humanos e que tenha recursos para possibilitar a diluição do sofrimento emocional.
Conforme atende, o psicoterapeuta aplica técnicas que possibilitam ao paciente/cliente visualizar seu comportamento, seus pensamentos e suas convivências para que tudo isso se torne mais sensato e com menos sofrimento. Pode-se dizer que a pessoa disposta a rever suas questões ajuda a si mesma e a todos com quem convive. Importante dizer que o bom psicoterapeuta não impõe os próprios valores e pensamentos, mas ajuda a pessoa a identificar suas possibilidades de vida. O psicoterapeuta não aplica “sua experiência de vida” ou seus próprios pensamentos, mas seu conhecimento com base em estudos científicos e casos clínicos.
10. Tem psicoterapia gratuita?
Sim, existem algumas instituições que atendem de graça, normalmente as clínicas escola, que são clínicas vinculadas a instituição de ensino (universidades, faculdades, locais de espacialização, associações etc.), ou na rede do SUS (Caps, UBS, ambulatório de especialidades e alguns hospitais).
11. Onde posso encontrar um terapeuta particular?
A melhor forma de encontrar um terapeuta é por indicação, ou seja, se alguém tem referência para lhe indicar. Dizendo se foi bom pra ela ou alguém que ela conhece, ou um profissional de saúde que já lhe conheça e perceba que tem algo que precisa ser acompanhado em psicoterapia, como, por exemplo, um médico seu. Outra possibilidade cada vez mais usada é a busca através da internet.
Mas em todas as formas é necessário você checar esse profissional para saber se ele é registrado no conselho de psicologia, caso seja psicólogo, ou no de medicina, com especialidade em psiquiatria, caso seja um médico. Sim, médicos psiquiatras e psicólogos podem fazer psicoterapia como a maior parte das pessoas conhecem.
Outra coisa interessante é pesquisar é se esse profissional se especializa constantemente, frequenta cursos e/ou congressos, continua a estudar.
12. Eu tenho que ir com a cara do(a) terapeuta?
Sim, o primeiro contato é importante por conta disso também. Temos que nos sentir minimamente à vontade com a pessoa com a qual vamos nos abrir. É importante perceber que o “ir com a cara” tem a ver com questões além de diferenças ou proximidades físicas, e sim com uma percepção de escuta verdadeira por parte dessa pessoa.
13. O terapeuta tem que ir com minha cara?
Sim, é fundamental que o terapeuta se sinta à vontade com você para poder lhe ouvir de forma neutra, sem julgamentos ou pré-conceitos. Além de saber atender a sua demanda.
Além disso, nenhum terapeuta tem especialidade em tudo, por isso é importante o terapeuta poder lhe dizer que precisa lhe encaminhar.
14. Posso ser amigo dela, e tipo sair para almoçar, beber, dançar?
Não! Temos que ter afeto quando estamos em psicoterapia, dos dois lados, porém não dá pra sermos amigos, pois isso irá dificultar a tal neutralidade ou imparcialidade na escuta e orientação. Quando entramos em contato com a vida cotidiana das pessoas, acabamos nos envolvendo afetivamente e podendo ser parciais.
Sabemos que procurar um psicoterapeuta é diferente de procurar um amigo. Quando procura um leigo a pessoa em sofrimento procura se convencer de uma opinião, uma posição. Mas quando procura um especialista ele procura a cura, ou seja, a transformação para seu sofrimento. É assim também com outros profissionais, por exemplo, muitas pessoas procuram o médico e não se automedicam, pois sabem a importância da indicação do remédio correto na dose correta. Com a psicoterapia é igual.
15. E se eu me apaixonar pelo(a) meu terapeuta?
Aí temos uma questão que pode ser discutida em psicoterapia. Seu terapeuta, por ser profissional, deve saber diferenciar o que é seu do que é dele, e com isso ele deve saber abordar esta questão de um jeito afetivo e acolhedor. Mas, se apesar disso ficar difícil conversar com o(a) terapeuta, é importante pensar em pedir uma indicação de um novo terapeuta, mas isso deve ser discutido com o(a) terapeuta.
16. Até onde posso falar? Tem algum limite? Como funciona o oversharing?
Teoricamente você deveria poder falar de tudo na sua psicoterapia, e o terapeuta saberá lhe dizer quando tem coisas que estão passando do limite e por quê. Ele não vai falar isso para te machucar, mas para que você entenda sua motivação, se, e como passou de um limite, isso pode ser muito importante em outras relações sociais.
17. Como sei que estou fugindo do principal?
Um antigo terapeuta meu, muito querido, falava: “Se você puder falar disso, tranquilamente, no ponto de ônibus, sinal de que não está trazendo pra psicoterapia o que precisaria trazer”. Ou seja, quando estamos falando de futilidades o tempo todo, podemos estar fugindo, mas um terapeuta atento consegue trazer, em quase qualquer conteúdo que você fale, coisas que são suas e que de certa forma vieram por estarem presentes em seu consciente.
O principal na psicoterapia é você e suas questões, sejam elas quais forem. Mas se sentir que não está conseguindo falar o que realmente importa, isso pode ser resistência à psicoterapia.
18. O que é resistência?
Resistência é um fenômeno que ocorre quando resistimos a entrar em contato com algo. Isso pode ocorrer pela dor que sentimos ou temos medo de sentir, medos, dificuldade de falar, e ficamos fugindo do que é importante entrar em contato. Essa resistência fica evidente aos olhos de um bom terapeuta e ele pode falar disso, de diversas maneiras, em sessão, para ajudar a quebrar essa resistência.
É normal ter momentos de maior resistência, pelos mais variados motivos, mas é muito importante superarmos esses momentos.
19. Quanto tempo demora para psicoterapia fazer efeito?
Psicoterapia não é medicação, então não faz efeito do dia pra noite. Para a psicoterapia fazer “efeito” é necessária a troca entre terapeuta e paciente/cliente. Na minha experiência, considero que as pessoas entram de fato no processo de psicoterapia em média depois de umas oito sessões. A partir daí, começam a fazer algumas percepções e alterações de comportamentos e emoções que podem estar incomodando, e se aprofundam nessas questões, mas isso também varia caso a caso.
Porém, quando se trata de psicoterapia breve ou de crise, ela acontece no início, pois trata de um tema, um assunto que é colocado em foco, sem entrar muito em outras questões da vida da pessoa, e o manejo do terapeuta, nesses casos, é bem diretivo.
Além disso, é importante pensar no efeito, rever comportamentos arraigados, que muitas vezes estão lá durante nossa vida inteira, não vão mudar do dia para a noite. Já uma crise por algo pontual, geralmente tem um começo recente, portanto o tempo para ser examinado e pensado em outras possibilidades é outro.
20. Por quanto tempo preciso fazer psicoterapia? É pra sempre? Como sei a hora de parar?
Isso varia de pessoa pra pessoa. Algumas gostam de psicoterapia e têm necessidade de ficar longos tempos, às vezes a vida toda em psicoterapia, sem interrupções e sem mudar de terapeuta. Outras pessoas gostam de trabalhar somente coisas mais pontuais, fazendo psicoterapia de tempos em tempos. Outras, ainda, gostam de variar de tempos em tempos, dão pausas na psicoterapia, às vezes voltam com o mesmo terapeuta, às vezes mudam.
Psicoterapia não precisa ser para sempre; pode ser, mas não precisa. O que vai definir o tempo de psicoterapia são as suas questões e necessidades a serem trabalhadas, e isso é feito junto com o terapeuta. Tem terapeuta que é mais diretivo e fala ativamente sobre alta, outros terapeutas não falam de alta, por entender que esta é uma demanda exclusiva do cliente/paciente.
A hora de parar é a hora que você sente que não está, por um tempo grande, fazendo mais diferença no seu dia a dia. Por que um tempo grande? Porque podemos estar em um momento de resistência.
21. Se meu caso for grave o psicólogo vai me encaminhar para um psiquiatra?
Se o seu caso necessitar de medicação, internação ou qualquer coisa de fim médico, o psicólogo vai encaminhá-lo para um profissional médico sim, na maior parte das vezes psiquiatra, quando se tratar da sua saúde mental. Mas o encaminhamento também pode ter outras questões físicas, que o psicólogo consegue perceber na psicoterapia que não está bom e encaminhar para um clínico, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, educador físico, nutricionista, entre outros.
22. Remédio ou psicoterapia? O que é melhor?
São duas coisas completamente diferentes e, ao mesmo tempo, em muitos casos, complementares.
O remédio vai aliviar sintomas de um adoecimento psiquiátrico sem cuidar dos mecanismos psicológicos associados ao problema, o que a psicoterapia faz. A psicoterapia, em alguns momentos, pode demorar a aliviar essas sensações ruins e sintomas de adoecimento, então dependendo da intensidade do sofrimento da pessoa, pode ser necessário associar medicação, até para poder trabalhar as questões em psicoterapia.
É importante dizer que somente profissionais da área médica podem prescrever medicação. Psicólogos não podem e não são treinados para exercer tal função.
23. Um psicólogo pode usar terapias alternativas?
Segundo nosso código de ética, não podemos misturar outros saberes além da psicologia nos atendimentos de psicoterapia. Por exemplo, não cabe durante o atendimento em psicoterapia falar de homeopatia, florais de Bach, quiromancia, numerologia, tarot etc. Mas a pessoa pode trabalhar com isso em outros contextos e, preferencialmente, encaminhar para alguém, se achar que alguma destas práticas pode te ajudar.
24. Se eu for menor de idade, o psicólogo pode contar o que eu falo para meus pais?
Não, a menos que isso te coloque em risco ou coloque alguém em risco. O sigilo terapêutico só é quebrado nesses casos e com ciência do paciente/cliente, seja ele menor ou não.
Em caso de menor de idade, às vezes é necessário falar com os pais e/ou responsáveis, até para uma orientação sobre o que está ocorrendo, mas o menor deve ter ciência do que será aberto aos pais.
25. Qual as funções de um psicoterapeuta?
A função dos psicoterapeutas é ajudar o paciente/cliente. Ele vai fazer isso tentando compreender o papel das funções mentais no comportamento individual e social/ grupal, estudando também os processos fisiológicos e biológicos que acompanham os comportamentos e funções cognitivas. Eles visam a explorar conceitos como percepção, cognição, atenção, emoção, inteligência, fenomenologia, motivação, funcionamento do cérebro humano, personalidade, comportamento, relacionamentos interpessoais, incluindo resiliência, dentre outras áreas. Psicoterapeutas de orientações diversas também estudam conceitos como o pensamento, inconsciente, consciente e seus diferentes modelos.
26. Qual a função da psicoterapia?
A função da psicoterapia é de auxilia a pessoa a elaborar conflitos psíquicos e a desenvolver recursos para lidar com situações imprevistas e novos desafios que são inerentes à vida.
Em psicoterapia, a pessoa deve contar com um espaço ético, sigiloso e acolhedor, no qual poderá compartilhar suas experiências de vida e refletir a respeito das dificuldades que está passando. Assim, o processo psicoterápico ajuda na estruturação de uma personalidade mais saudável e adaptada à vida em sociedade.
27. Quais questões mais comumente podem levar alguém a buscar psicoterapia?
Entre outros.
O mais importante é pensar que a ideia de buscar terapia é já o primeiro passo de um processo de autocuidado e que pode, se nos entregamos, ajudar muito!
E esse momento é um momento muito “especial” na vida de todos nós. Estamos em um dos momentos de maior incerteza, isolados uns dos outros, mas ao mesmo tempo com convívio em tempo integral com outras pessoas, com preocupações sobre emprego, aspectos financeiros. Então sim... para muitos a hora é agora!
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